sexta-feira, 30 de julho de 2010

Por que vai o Benfica perder o campeonato

Chegou o momento mais esperado do ano para os três indivíduos que leram o meu blogue antes do início da última época (três é uma estimativa, pecando eventualmente por excesso): aquele em que eu anuncio quem não vai ganhar o campeonato.

Na época de 2010/2011 o campeão não vai ser o Benfica. O que, por exclusão de partes, levará a que o Porto ganhe o campeonato. Tal como no ano passado o Benfica só ganhou o campeonato porque o Porto o perdeu, este ano vai ser o mesmo, mas no sentido oposto.

Por que é que o Benfica não vai conseguir ser campeão? Curiosamente, na sua maioria, pelas mesmas razões por que o Porto não ganhou no último ano. A saber:

1 - A ressaca. A vitória no campeonato apareceu de um momento para o outro, e não foi devidamente sustentada. Não resultou de um trabalho sólido e consciente, resultou do fortalecimento da equipa com três jogadores nucleares (Javi Garcia, Ramires e, sobretudo, Saviola) e da entrada de um treinador competente, que melhorou os bons jogadores que já lá havia. Dito isto, o campeonato foi exaustivo e emocionalmente esgotante. Para um benfiquista como eu, que se lembra bem de todos os campeonatos desde o tempo de Eriksson, o único campeonato mais violento do que este foi o da época do 6-3 em Alvalade. Este ano os jogadores vão pagar a factura, já para não dizer que o sentido de urgência que levou a várias vitórias no ano passado terá desaparecido. Isso será suficiente para tirar entre seis a oito pontos no campeonato.

2 - A estagnação. Ao contrário do ano passado, a equipa do Benfica não se reforçou. Nenhum dos jogadores que o Benfica contratou será, provavelmente, titular indiscutível pelo menos até Dezembro, e o único com hipóteses é Gaitán. Enquanto isso, o Porto contratou Moutinho para o onze e um novo treinador, que possivelmente será considerado o melhor em Portugal no final da época, tendo gasto já quase trinta milhões de euros em reforços. Vai perder Bruno Alves, que no ano passado já não estava lá, e Raul Meireles, que só começou a jogar a sério no Mundial para poder ser transferido.
O Porto vai estar mais forte e com uma nova dinâmica. Estabeleceu, claramente, esta época como a primeira de um novo ciclo, com a entrada de um treinador de qualidade e com ideias modernas e um grupo de jogadores à volta dos 20 anos (Moutinho, James, Sousa, Walter, Ukra, Castro) que se junta a outros ainda jovens e já com a rodagem feita (Hulk, Pereira, Rodriguez, Miguel Lopes, Falcão, Fernando) - não falo do Ruben Micael porque acho que em Janeiro já vai andar a limpar o banco. Juntos serão a estrutura da equipa do Porto para os próximos cinco anos. Mas têm qualidade suficiente para ganhar já esta época. O Porto trabalha bem e não precisa de grandes fases de transição. Um bom arranque de campeonato, com uma vitória em casa frente ao Benfica no Dragão, será suficiente para lançar o Porto para a conquista do título, tal como aconteceu, novamente, no inverso, com o Benfica na época passada. O que nos leva a...

3 - O calendário. As primeiras dez jornadas do Benfica são fulminantes. Nesses dez jogos jogará fora de casa com Nacional, Guimarães, Marítimo e Porto e receberá Sporting e Braga. Para tornar tudo mais difícil, três dos jogos da Liga dos Campeões calham: entre Guimarães e Sporting; entre Marítimo e Braga; e antes do jogo das Antas, sendo este o da quarta jornada da fase de grupo, ou seja, provavelmente o mais importante dos seis. O Benfica só tem verdadeiras hipóteses de ser campeão se passar esta fase inicial de dez jogos com, no máximo dois empates e uma derrota, sendo que um dos que não pode perder é o jogo das Antas. Vejo isto como impossível, sobretudo por causa das duas razões que se seguem...

4 - O Mundial. Metade da equipa titular do Benfica (Luisão, Ramires, Maxi, Coentrão e Cardozo) não vai fazer pré-época, ao contrário do ano passado, e vai sofrer o inevitável efeito retardado do Mundial. Acontece a praticamente todos os jogadores que participam num Mundial: na época seguinte baixam de rendimento. A eventual vantagem que o Benfica teria sobre a concorrência, que seria a de começar a época com uma equipa rotinada, vai perder-se no sub-rendimento desses jogadores.

5 - A debilidade do plantel. A equipa do Benfica ganhou o título completamente esmifrada. Se o campeonato durasse mais quatro ou cinco jornadas provavelmente o Benfica perderia o campeonato. A prova foi ganha praticamente jogo a jogo, final a final, como Jesus disse, aproveitando picos de forma de alguns jogadores (Saviola, Di Maria, Cardozo, Weldon, Carlos Martins. Coentrão) que, no global, tiveram uma temporada muitíssimo irregular, sacando alguns pontos à custa de jogadas estudadas, de debilidades pontuais dos adversários e, admita-se, de bastante sorte. Há pelo menos seis jogos em que o Benfica é extremamente feliz (Guimarães, fora; Porto, em casa; Sporting, em casa; Nacional, fora; Braga, em casa; Naval, fora) e que decidiram o campeonato a seu favor.
O Benfica ganha o campeonato preso por arames, e esgotando todas as alternativas do seu plantel não teve, sequer, capacidade para chegar às meias-finais da Liga Europa, que é muitissimo mais fraca que a Liga dos Campeões. Jogadores como César Peixoto, Ruben Amorim, Carlos Martins, Kardec, Sidnei, Jara são soluções apenas no papel. Não têm a mesma qualidade dos titulares e, se podem oferecer vinte a trinta minutos e qualidade num jogo, não podem oferecer garantias de substituir os titulares ao mesmo nível num jogo realmente importante, pois falham em demasia.
O Benfica não tem a melhor equipa portuguesa - é o Porto que a tem. O Benfica, simplesmente, fez o melhor campeonato, em boa parte porque o Porto sofreu aquilo que o Benfica vai sofrer este ano e o que todas as equipas que participam na Champions sofrem: um desgaste físico e psicológico de até Dezembro que deixa marcas até ao final da época. Poucas são as equipas que resistem. O próprio Inter, para chegar a ser campeão europeu, só não foi obrigado a oferecer o campeonato à Roma porque a Roma deu uma série de tiros nos pés que o devolveram ao Inter. A época mais difícil, a nível interno, para Mourinho, foi a que lhe deu o título europeu. Nenhuma equipa da Europa passa incólume pela Champions, e o Benfica é uma equipa de terceira linha europeia, com um banco muito fraco.

6 - O mercado. O Porto foi vítima do mercado no ano passado. Não só perdeu dois dos seus quatro melhores jogadores como se viu forçado a manter os outros dois (Alves e Meireles) para não desmantelar completamente a equipa, vendo a sua produção cair brutalmente. Mesmo assim andou na luta e no final da época goleou o Braga e o Benfica. Este ano, pelo contrário, o Porto reunirá um grupo de jogadores totalmente concentrado e super-motivado por sentir que perdeu um título (o de melhor equipa de Portugal) que realmente lhe pertence, enquanto o Benfica terá pelo menos cinco dos seus melhores jogadores (Luisão, David Luiz, Ramires, Coentrão, Cardozo) a pensar, nos piores momentos (quando vier a inevitável sequência de maus resultados, que acontece a todas as equipas e que no ano passado, milagrosamente, não aconteceu), que poderiam estar noutra equipa a ganhar três ou quatro vezes mais e, em vez disso, continuam no Benfica, agora a ser assobiados - porque, com três maus resultados consecutivos, nenhum benfiquista vai querer saber do campeonato do ano passado. E, finalmente...

7 - O Sporting. A época do Sporting foi excepcionalmente infeliz, e não se vai repetir. O Sporting voltará a ficar nos três primeiros e, dito tudo isto, acho muito provável que venha a encontrar no Benfica não só o adversário mais vulnerável dos três grandes como aquele com quem concorrerá, a partir de certo momento, directamente para o segundo lugar. Para o Sporting - que se viu livre das criancinhas e foi buscar profissionais tarimbados e sérios, como o campeonato exige - é sempre mais fácil acreditar que pode ganhar ao Benfica que ao Porto. O Sporting recebe o Benfica na segunda volta e vai apertar-lhe os calos. Também está a criar uma nova dinâmica, tem uma nova linha dura de actuação que irá recolher bons frutos no rendimento dos jogadores e não tem nada a perder. Aliás, por incrível que pareça, se eu tivesse de dar um palpite para a ordem final dos três grandes seria Porto, Sporting e Benfica em terceiro.

Como dizem os americanos, o karma é fodido.

terça-feira, 11 de maio de 2010

Porqué no te callas?

Vi dez minutos da entrevista do Choramingos Paciência à Sport TV – se deus quiser a última durante muito tempo. A certa altura, o entrevistador, muito encavacado, perguntava-lhe, a propósito do jogo que o Benfica adiou com o Sporting, se ele não teria feito o mesmo.
O Choramingos, que continuava confortavelmente a lavrar naquela sanha calimérica que adoptou desde o início da época, pareceu algo surpreendido. Afinal, que desplante era aquele de o confrontar com a sua choraminguice em plena televisão e em directo, sem lhe dar tempo para pensar numa argumentação decente. Ele disse que sim, que faria o mesmo, e lá acabou por ter de admitir que o que o Benfica tinha feito não tinha nada de mal.

Foi um momento engraçado, que não seria possível se alguém lhe tivesse feito a mesma pergunta mais cedo – por exemplo, nas conferências de imprensa episcopais de Braga, em que os jornalistas destacados, geralmente os mesmos que cobrem a área das Antas, levavam as perguntas bem alinhavadas (como é costume) para servir a política de comunicação papal.
Desde o início da época, o Choramingos queixou-se todas as semanas – todas as semanas! – de alguma coisa, se bem que alguns momentos servissem de âncora para as semanas seguintes. Por exemplo:

1 - No início dos treinos queixou-se de ter jogadores com lesões musculares como desculpa para falhar na Liga Europa. Não referiu que, na época anterior, o plantel teve de ser esmifrado para poder jogar duas vezes por semana, no campeonato e na Liga Europa, onde o Braga chegou aos quartos-de-final. Esta queixa tinha dois propósitos: responsabilizar Jorge Jesus pela previsível eliminação na Liga Europa (como aconteceu) e atacar Jorge Jesus, recém-contratado treinador do Benfica, que urgia descredibilizar. Choramingos foi a voz dos donos.

2 - Com o jogo de Braga, contra o Benfica, em que venceu, chegou o famoso caso Vandinho. O caso Vandinho, recorde-se, começou com Di Maria a pontapear uma bola, ao intervalo, na direcção do banco do Braga. Aquele gesto era de frustração por dois motivos: primeiro porque o Braga estava a ganhar e a jogar melhor que o Benfica; depois porque, nessa altura, já se percebia perfeitamente que o Braga era uma espécie de Porto B, uma milícia aparelhada e orquestrada por Pinto da Costa, desde o presidente aos jogadores emprestados, passando pelo treinador, que em campo jogava com o mesmo ódio que revelava nos jornais.
Nesse jogo houve três castigos a jogadores:
-pelo Benfica, Cardozo, já então o melhor marcador do campeonato, que levou dois estalos na cara, pelas costas, à entrada do túnel, sendo expulso e suspendido por dois jogos;
- pelo Braga, Mossoró, Nei e Vandinho. Este foi suspendido por três meses por tentar agredir um treinador-adjunto do Benfica.
Como Vandinho era titular do Braga, a teoria que Choramingos passou a explorar até ao fim da época foi a de que o Conselho de Disciplina da Liga, a mando do Benfica, o tinha suspendido discricionariamente para prejudicar o Braga. A hipótese de esse castigo beneficiar tão ou mais o Porto (então terceiro) que o Benfica nunca foi aventada por Choramingos.
Da mesma forma, quando o castigo a Hulk foi cortado, numa mera afronta juridicamente infundamentada por parte do CJ da Federação ao CD da Liga, o castigo a Vandinho manteve-se. Nunca, até hoje, se ouviu Choramingos ou alguém do Braga a comentar a decisão do CJ, que confirmou a do “odiado” CD. Nunca comentou, nem poderia comentar, também por uma de duas razões: ou o castigo de Vandinho era justo, e isso significaria que o Braga teria (segundo a argumentação dos seus responsáveis) perdido o campeonato por culpa de Vandinho e não por maquinações do sistema; ou o levantamento do castigo ao Hulk era errado, o que significaria que o álibi utilizado pelo Porto para não reconhecer ao Benfica mérito na conquista do campeonato era uma fraude – e isto Choramingos só poderia admitir se não estivesse a pensar, como está, enquanto treinador não do Braga mas do Porto emprestado ao Braga. A sua lealdade é com o Porto, e o campeonato que pretendeu ganhar era não do Braga mas contra o Benfica. Só acredita na total legitimidade da goleada do Porto ao Braga nas Antas (nesse jogo, fundamental para a época do Porto não acabar logo ali, a dois meses do fim, o Braga sofreu um terço do total de golos no campeonato) quem nasceu com asinhas nas costas.
Curiosamente, o segundo caso é que é verdadeiro: apesar de absurdo, o castigo a Hulk é que era o correcto e não deveria, segundo a lei do campeonato, assinada por todos os clubes, ter sido levantado. Tal como o Pedro Henriques resumiu muito bem após o jogo do Benfica com o Rio Ave, quando os clubes ganham está tudo bem, quando perde queixam-se das leis que eles próprios fizeram.

3 – Quando o Benfica antecipou o jogo com o União de Leiria para poder ter uma semana se treinos entre os dois jogos com o Hertha para a Liga Europa o Choramingos queixou-se de que o Benfica estava a fazer truques para poder passar para o primeiro lugar da Liga. Ficaremos sempre sem saber o que diria o Choramingos se o Benfica, em vez de ganhado, tivesse empatado ou perdido esse jogo – o que seria igualmente possível, obviamente.
Por outro lado, nunca ouvimos o Choramingos queixar-se por jogar mais de metade dos seus jogos um ou dois dias antes do Benfica. Provavelmente porque teria de utilizar um argumento que é óbvio: a pressão não vem da data, vem da vitória, e no fim do campeonato as equipas fazem todas o mesmo número de jogos.
Quando o Sporting aceitou adiar o jogo com o Benfica após o jogo com o Marselha o Choramingos queixou-se do Sporting e insinuou que era concorrência desleal, porque as taças europeias fazem parte do calendário. Esqueceu-se de mencionar – o que só aconteceu agora, novamente por causa do atrevido entrevistador da Sport TV – se o facto de haver uma equipa a disputar apenas uma competição a lutar contra outra que tenta ganhar três, sendo uma delas em competição com algumas das boas equipas europeias, não era muito favorável à primeira. É claro que teve de admitir que sim.

4 – Na Luz, assim que sofreu o golo do Luisão, começou a apontar para o relógio. Depois do jogo explicou que o golo do Benfica tinha sido marcado seis segundos – seis segundos!!! – depois da hora. Convém dizer que o golo nasce na sequência de dois cantos consecutivos a favor do Benfica. Para começar, cada canto demora dez segundos a marcar. Depois, o que diria o Choramingos se o árbitro mandasse parar o jogo seis segundos depois da hora antes de o Braga marcar um canto. Obviamente, que era para prejudicar o Braga. Se fosse ao contrário diria, provavelmente, o que disse depois de o mesmo Luisão ter visto um golo ser mal invalidado no jogo de Braga, com o resultado em 0-1: nada. Ou então o óbvio: que era futebol.

5 – Agora que o campeonato acabou Choramingos recorda que a luta foi desigual, não só por causa das maquinações anteriormente referidas como porque o Benfica tem muito mais dinheiro do que o Braga (algo de que Choramingos nunca se lembrou quando jogou no Porto, que não ganhou os seus campeonatos propriamente por ser um clube pequeno e sem influência sobre a arbitragem e conselhos afins) e porque jogou um terço do campeonato contra dez jogadores.
Neste último caso, que vem a propósito da expulsão de um jogador do Rio Ave aos dez minutos por dar um pontapé nos tomates do Ramires, Choramingos nunca irá admitir uma evidência: que é muito mais provável uma equipa provocar amarelos, vermelho, livres e penáltis quando joga deliberadamente para a frente e em progressão com a bola, como foi o caso do Benfica, com Di Maria, Aimar, Saviola, Coentrão, Carlos Martins, etc, do que quando se joga com quatro defesas, três trincos e dois médios-ofensivos, à espera de que o adversário se canse para começar a atacar, e com o seu melhor jogador (Alan) a passar o tempo todo a jogar com o cu encostado ao defesa e virado para a sua própria baliza.

Acima de tudo, e seja pelo que for, Choramingos chora. A teoria de que o Braga é o verdadeiro campeão é a mais fiel representação da figura que os jornalistas, analistas e desportistas tanto desprezam quando se perde mas que não conseguem deixar de louvar no dia-a-dia assim que alguém consegue fazer qualquer coisinha apenas acima da média: a do campeão moral.
A vitória moral de Choramingos será efémera, obviamente, e tenho muita pena que ele não vá para o Porto, mas se alguém pensa que o Pinto da Costa embarca num tipo cujo grande talento é fazer beicinho só porque nasceu em Leça da Palmeira e marcou uns golos pelo Porto é porque, realmente, ainda não entendeu a natureza do animal.
Com este discurso da treta, no Porto, Choramingos passaria um ano a levar no focinho e, no final da época, seria trucidado para dar lugar ao próximo. Seria uma espécie de Couceiro, ou de Carvalhal no Sporting.
Infelizmente não vai acontecer.
Mas há uma questão que o jornalista da Sport TV poderia ter colocado ao Choramingos: a de se, considerando que ele é uma grande promessa do futebol português, é suposto esperarmos que um dia venhamos a ter mais um seleccionador nacional a queixar-se de que a bola está vazia, de que as linhas estão tortas ou de que a malha das camisolas provoca prurido cutâneo aos jogadores.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Choramingos, paciência

Em qualquer país do mundo com uma cultura vencedora o treinador do Braga seria ridicularizado numa base diária. Seriam lavrados textos humorísticos com o Choramingos a lamentar-se de tudo o que mexesse - dos árbitros, dos horários dos jogos, da relva, do tempo, dos castigos, das lesões, das vendas, das compras, dos treinadores anteriores. Seriam feitas caricaturas em que se ampliariam os seus olhos lacrimejantes antes, durante e após os jogos (sempre que lhe aparece uma câmara à frente), o seu beiço inferior eternamente lamurioso, pingando baba e ranho; a sua fisionomia de desgraçadinho, que o acompanha desde que cavava penáltis a eito nos gloriosos tempos de Carlos Alberto Silva, de Adriano Pinto e do Guarda Abel, juntamente com o seu colega Kostadinov (ainda me lembro das suas belas cabeleiras à Futre atirando-se para trás assim que se aproximavam da área, e da certeza científica com que chegavam os apitos dos Calheiros, dos Soares Dias, Dos Fortunatos Azevedos, dos Guímaros, dos Silvanos nos momentos apropriados).

Em qualquer país do mundo em que o Calimero fosse uma figura satírica, e não um modelo humano como é aqui, Choramingos Paciência (Paciência, por Deus!) seria massacrado. Em Portugal é um mestre da psicologia. E porquê?

Porque pegou numa equipa que cronicamente fica entre os quatro primeiros do campeonato, uma equipa construída de raiz pelo actual director-desportivo e pelo anterior treinador, e, jogando uma vez por semana (quando não por quinze dias ou por três semanas), depois de ter sido precocemente eliminado da Liga Europa, da Taça de Portugal e da Taça da Liga, a levou ao segundo lugar num campeonato tão fraco que permitiu, por exemplo, que os três primeiros tenham acumulado mais pontos, em conjunto, que em qualquer outro nos últimos vinte anos, que o campeão, tendo uma equipa a jogar apenas acima da média, apenas tenha perdido dois jogos e empatado quatro ou cinco e que o quarto classificado, um histórico terceiro candidato ao título, acabe a trinta pontos do primeiro.

O grande feito de Domingos foi ter feito de uma equipa no ponto máximo de maturação segundo classificado no campeonato. Fê-lo recorrendo a um estilo de jogo igual à do pior Porto dos últimos vinte anos, o de Carlos Alberto Silva, precisamente aquele em que ele foi mais importante - um estilo cínico, ultra-defensivo, que joga quase tudo no desgaste do adversário, muito à imagem do Boavista campeão de Jaime Pacheco que, além desse campeonato martelado no gabinete do Major Valentão, só trouxe miséria quer ao clube quer ao futebol português. É o mesmo discurso miserabilista, a mesma filosofia trauliteira, a mesma piedade provinciana.
Tal como esse título - que, segundo os entendidos, seria fantástico para o futebol português - também esta campanha "de Campeões" do Braga será, na verdade, irrisória. Tal como esse título, ela foi sustentada num futebol negativo e numa abordagem terrorista do jogo e do campeonato, recorrendo a esquemas mentais antigos para inventar fantasmas e munições onde eles não existiam.

Tal como o Boavistão, o Braguinha voltará rapidamente à mediania, senão mesmo à mediocridade, porque, ao contrário de Benfica, Porto e Sporting, que se impuseram à história e se tornaram grandes não por jogarem contra alguma coisa mas por ambicionarem mais e oferecerem às pessoas sonhos de grandeza pura, o Braga não promete nada. O seu futebol é fraco, os fantasmas desaparecem e a sua base social não vai resistir ao baque. Há em Braga mais benfiquistas que braguistas - este termo, aliás, nem sequer existe.
Acho muito mais provável que o Vitória de Guimarães sobreviva ao Braga, por exemplo, que o inverso. O Braga está a um ou dois anos maus de voltar ao meio da tabela, e aposto o que for preciso que nunca será campeão nacional - ou pelo menos nos próximos trinta anos.

O famoso castigo ao Vandinho (no mesmo jogo em que o Cardozo foi suspenso por levar duas chapadas na cara) foi a melhor coisa que aconteceu ao Braga esta época. É altamente duvidoso que o Braga tivesse feito melhores resultados com Vandinho do que os que fez sem Vandinho. Pelo contrário, esse castigo foi cavalgado durante meses a fio pelo Choramingos, o que, juntamente com a ausência de jogos europeus, lhe permitiu evitar que os seus jogadores se distraíssem. Nem o Vandinho, de certeza, sabia que era tão bom jogador e tão importante para o Braga como o Choramingos o fez. E é preciso não esquecer que o Vandinho - o Vandinho... - é um trinco, e que só é tão importante para o "esquema" porque o Braga é uma equipa de trincos, e de meios-avançados, e de médios-laterais recuados, e de defesa e contra-ataque, que marcou menos trinta golos que o primeiro, menos vinte que o segundo e que ganhou sete jogos por 1-0 (21 pontos com sete golos em sete jogos).

O que vai acontecer na próxima época é o seguinte:
- O Braga vai começar a época mais cedo para jogar as duas eliminatórias da Liga dos Campeões. Vai falhar o apuramento porque vai apanhar uma equipa francesa, inglesa, espanhola ou alemã na segunda e vai jogar para a Liga Europa;
- a Liga Europa é pior do que a Liga dos Campeões porque dá o mesmo trabalho e muito menos proveito. Em Fevereiro o Braga já leva mais tempo de trabalho nas pernas que nesta época e, porque o Natal não é quando o homem quer, anda a jogar para o quarto lugar com o Guimarães, com o Marítimo e com mais um ou outro que apareça. Basta o Sporting ter uma época mais normal - que vai ter - para o Braga desaparecer do pódio;
- O Choramingos, sem os mesmos resultados, vai andar a chorar para o boneco. Não só ninguém lhe vai ligar nenhuma como se vai tornar mais evidente que ele é, não diria uma fraude, mas uma aproximação. Não vai parecer diferente de um Vítor Pontes, de um Manuel Machado, de um Paulo Sérgio, e vai parecer muito diferente de um Mourinho ou de um Jesus.

Há um cenário que eu adoraria que fosse diferente, mas que infelizmente não vai ser: um em que o Choramingos fosse para treinador do Porto. Seria fantástico. Um treinador derrotista num clube em quebra seria o melhor que poderia acontecer aos outros, ainda por cima um homem da casa, que atirasse aquela gente toda uma contra a outra.
Mas o Pinto da Costa não vai nisso. Não vai ser nem o Domingos, nem o Jorge Costa, nem o Vilas-Boas. Continuo a dizer, como já disse há mais de um ano, que o próximo treinador do Porto vai ser o Carlos Queirós. Aliás, todas estas cortinas de fumo que vão sendo lançadas servem apenas para dar tempo a Queirós de despachar o Mundial. Portugal fica-se, na melhor hipótese, pelos quartos-de-final, logo no princípio de Julho, e a época do Porto só começa quase um mês depois.

O cenário mais provável será este: Carlos Queirós como treinador principal e Jorge Costa como primeiro adjunto. O cenário hipotético será o de um treinador estrangeiro muito experiente com Jorge Costa como adjunto. Alguém do nível de Eriksson, Hiddink ou semelhante. O Porto vai gastar dinheiro a sério, em treinadores e jogadores. A hipótese de um segundo título consecutivo para o Benfica é real.

O terceiro cenário, que não refuto, é a contratação de Jorge Jesus ao Benfica pela cláusula de rescisão.